As lesões de via biliar após uma cirurgia de colecistectomia são potencialmente graves. A reconstrução da patência das vias biliares sempre foi um dos capítulos de maior desafio para os cirurgiões, tanto pela dificuldade técnica que essas lesões apresentam quanto pelas possíveis complicações da reconstrução. A clássica técnica de reconstrução com anastomose término-lateral obtinha resultados ruins a longo prazo, mesmo em centros terciários, com re-estenoses freqüentes e necessidade de re-operações entre 12-25%, além de outras complicações comuns, como a colangite ascendente.
Com o advento da técnica idealizada por Hepp e Couinaud(1) ocorreu uma melhora importante nos resultados das séries publicadas, como 95% de excelência na função da anastomose sem necessidade de re-intervenções (2). Esta técnica permite a realização das características almejadas por qualquer anastomose visceral (ampla, mucosa-mucosa e com aposição de tecidos sadios).
A técnica descrita por Hepp(3,4) foi idealizada para lesões altas, na altura ou acima da confluência dos ductos biliares. Ela consiste na dissecção da placa hilar para obtenção de um adequado acesso ao ducto hepático esquerdo. Uma vez identificado este é incisado e é realizada a exploração com dilatadores de Bakes e pinças de Desjardin. Uma anastomose ampla (2,5 a 3,0 cm) látero-lateral entre o ducto biliar e um segmento de intestino delgado é realizada, respeitando a aposição perfeita entre tecidos (mucosa-mucosa), utilizando fios de absorção longa de fino calibre. A realização de Y de Roux para evitar complicações como refluxo é normalmente adotada.
Comparando a anastomose látero-lateral de Hepp com a término-lateral clássica, pode-se observar que aquela necessita de uma menor manipulação de dissecção de tecidos, preservando mais o suprimento sanguíneo e permitindo anastomoses mais amplas e confortáveis. Séries de importantes centros mundiais (5,6) sedimentaram a técnica como de escolha nos casos de lesões altas e da confluência das vias biliares. Lembrando sempre que também existe o fator de experiência do serviço com a cirurgia hepato-biliar e que o insucesso pode complicar cada vez mais o manejo do paciente podendo inclusive este evoluir com a necessidade de transplante hepático.
Referências bibliográficas.
HEPP J, COUINAUD C. L’abord et l’utilisation du canal hépatique gauche dans les réparations de la voie biliaire principale [Approach to and use of the left hepatic duct in reparation of the common bile duct]. Presse Med. 1956 May 23;64(41):947-8. French. PMID: 13335941.
Winslow ER, Fialkowski EA, Linehan DC, Hawkins WG, Picus DD, Strasberg SM. “Sideways”: results of repair of biliary injuries using a policy of side-to-side hepatico-jejunostomy. Ann Surg. 2009 Mar;249(3):426-34. doi: 10.1097/SLA.0b013e31819a6b2e. PMID: 19247030.
Hepp J. Hepaticojejunostomy using the left biliary trunk for iatrogenic biliary lesions: the French connection. World J Surg. 1985 Jun;9(3):507-11. doi: 10.1007/BF01655291. PMID: 4013364.
Myburgh JA. The Hepp-Couinaud approach to strictures of the bile ducts. I. Injuries, choledochal cysts, and pancreatitis. Ann Surg. 1993 Nov;218(5):615-20. doi: 10.1097/00000658-199321850-00005. PMID: 8239775; PMCID: PMC1243031.
Blumgart LH, Kelley CJ, Benjamin IS. Benign bile duct stricture following cholecystectomy: critical factors in management. Br J Surg. 1984 Nov;71(11):836-43. doi: 10.1002/bjs.1800711110. PMID: 6498456.
Bismuth H. Postoperative strictures of the bile duct. In Blumgart LH, ed. The Biliary Tract. Edinburgh: Churchill Livingstone, 1982; 209-218.